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[powerpoint apresentado no II Curso Pós-Graduado de Atualização sobre Direito da Medicina e Justiça Penal, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa]


O problema penal
Artigo 283.º do Código Penal
Questões:
+ natureza coletiva (segurança da saúde pública)
Problema:
Consequências das duas hipóteses


Solução sistematicamente adequada:
Crítica a Damião Cunha no Código Conimbricense (p. 1006 e ss):

No entanto, independentemente de outros crimes contra as pessoas, por ação ou omissão, o seu comportamento poderia caber no artigo 283º: usa o seu controle sobre a transmissão de doenças dolosa ou negligentemente
Os argumentos de D. Cunha:
Os argumentos de F. Palma:
Argumento da ratio legis ?
Argumento sistemático ?
Imputação objetiva
• A criação do perigo do perigo em que é que consiste?
• Para Roxin (Strafrecht , Allgemeiner Teil), 3ª ed., p.354), citando jurisprudência germânica, a imputação no tipo objetivo nos crimes de perigo concreto(Gefährdungsdelikte)pressupõe que a ação típica afetou intensamente a segurança de uma pessoa ou coisa de modo que só por acaso é que o bem jurídico não é lesado.

• O seu critério parece ser o da inevitabilidade do dano sem medidas imprevisíveis
• A imputação objetiva no crime de propagação não pode exigir já a verificação da doença que ultrapassa o perigo nem se bastar com a mera disponibilidade por um hospital de um produto infetado ou até um contacto da potencial vítima com o agente infeccioso.•Deve exigir ,antes,uma fase de inevitabilidade do curso infeccioso, que em geral exigirá um contacto e um curso previsível
• No caso célebre dos hemofílicos , o Tribunal da Relação de Lisboa , considerou consumado o crime de perigo com a disponibilização hospitalar do produto infetado•Na tese da defesa: «O crime de propagação de doença contagiosa é um crime de perigo concreto o que faz dele, por isso mesmo, um crime de resultado;
Assim, no caso concreto, o momento da consumação deu-se em 18 de Julho de 1986, isto é, no momento em que entraram nos Hospitais Civis de Lisboa 500 frascos do lote n.º 810536 (Factor VIII) e que estariam eventualmente infectados com o vírus da Síndrome da lmunodeficiência Adquirida»
As configurações:
- Dolo de propagação + criação dolosa do perigo
2. Dolo de propagação + negligência de perigo
3. Negligência de propagação + negligência de perigo
Exemplos:
- disponibilização de sangue contaminado com representação e aceitação desse facto e indiferença pela criação do perigo
2. disponibilização de sangue contaminado com representação e aceitação desse facto, mas convicção de que ninguém ficará sujeito ao perigo
3. disponibilização por falta de controle adequado de sangue contaminado

Problemas de imputação objetiva na transmissão da sida
• O modo de atuação da doença , atacando o sistema imunitário, e não provocando diretamente lesões permite concluir pela imputação objetiva da morte ou apenas do perigo?
• A resposta é afirmativa quanto ao dano, enquanto não existirem meios normalmente eficazes para impedir a evolução da doença.
• Quem é condenado à morte , sendo executada a sentença dali a anos,não deixa de morrer em consequência dessa condenação anterior
• Argumento da inevitabilidade
• Se morrer por outras causas, completamente estranhas, haverá interrupção do nexo causal.
Problemas de imputação subjetiva na transmissão do vírus da sida
1- Apesar da probabilidade de transmissão ser, em certos casos, baixa não deixa de existir dolo de propagação tal como nas situações de dolo direto com baixa probabilidade de êxito da ação
2- O dolo de propagação só é irrelevante quando houver nos casos de perigo negligenciável
Questões de direito de necessidade em face de um perigo de transmissão de doença contagiosa
• Justificação da violação do segredo médico no crime de transmissão?
Violação do segredo médico:
Respostas possíveis
1- Invocação do dever de segredo absoluto em função da relação de confiança e do bem público(posição da ordem dos médicos no acórdão do tribunal de torres vedras em 2007)
2- violação do segredo com invocação em concreto do direito de necessidade(artigo 34º)
3- dever de violar o segredo em casos de perigo iminente e muito grave insuperável de outro modo(artigo 135º,nº3, do Código de Processo Penal, posição do acórdão de 2007 do tribunal da Relação de Lisboa, no caso de torres vedras)
Internamento compulsivo de doentes infecto-contagiosos?

• Fundamento Constitucional?
• Fundamento legal?
• Deve ser fundamentalmente entendido como um ato médico, destinado ao tratamento do paciente
• Nessa base restritiva pode ser justificado por direito de necessidade de cariz público, na medida em que o portador da doença não é instrumentalizado, mas considerado um fim em si mesmo, não se violando a alínea c) do artigo 34º do Código Penal
Internamento e discriminação

Este pequeno painel sempre foi conhecido como Os Aleijados mas, recentemente, demonstrou-se que os homens são, na verdade, leprosos
Debate sobre internamento compulsivo de doente contagioso
• em 2005, o Tribunal da Relação do Porto decidiu que “é legal o internamento compulsivo de quem, padecendo de tuberculose pulmonar, recusa tratar-se e deambula pelas vias públicas, podendo assim afectar outras pessoas.”
Argumentos pro e contra
Pro:
• ponderação de valores e de interesses
• Saúde pública
Contra:
• afastamento dos doentes do tratamento
• Discriminação de certos doentes
Professora Doutora Maria Fernanda Palma
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